domingo, 21 de setembro de 2008

Solidariedade até a morte

Me lembro de estar caminhando pela chuva.Caminhando por São Paulo pela chuva.Quem olha de longe, acha que a cidade é uma civilização singular gigantesca cujos edifícios cortam o céu; uma civilização feita de asfalto e concreto.Mas quem vive aqui sabe que não.Na verdade, São Paulo é feita de póvora negra.Póvora negra e dinamites, prontos para explodir a qualquer instante.Por isso que quando chove, não se trata apenas de água, mas sim de um alívio.
Ao passar pela banca de jornais, me lembro de ter visto em uma revista de fofocas a foto de um participante do Big Brother Brasil com as mãos para o ato, e em vermelho e negrito, editado na capa da revista , "HERÓI".É, de fato, uma bela definição para o tipo de figura que grande parte da nação considera heróica.Mas me recordei então da notícia que há muito havia ouvido.
Em Erechim, no Rio Grande do Sul, em uma manhã de quarta-feira de chuva, um ônibus escolar com 30 estudantes caiu em um rio.Lucas Vezzaro, de 14 anos, foi um dos primeiros a sair do ônibus pela janela.É fácil deduzir que, naturalmente, qualquer ser humano deixaria seu instinto de sobrevivência falar mais alto em um momento como este; mas não, o garoto, em vez de ir para a borda do rio, voltou para o ônibus e salvou sua prima com mais uma amiga.Em seguida, retornou ao ônibus, já submerso, e resgatou outra garota.Sem hesitar, ele retornou ao rio na tentativa de salvar mais colegas.Foi uma viagem que não teve volta."Em casa, filho único, comportava-se de modo bem diferente do da maioria dos garotos de sua idade. À tarde, depois de almoçar com a mãe, lavava a louça, passava aspirador de pó na casa, varria o quintal, cuidava da horta e fazia a lição de casa. Mesmo com tantos afazeres, ainda achava tempo para o futebol com os amigos, para pequenas caçadas e para partidas de bocha. Uma de suas maiores diversões era pescar e se orgulhava de nadar bem. Estava na 8ª série e ainda não tinha definido o que estudaria mais adiante. "
Como disse um homem sábio, muito tempo atrás, "a opinião é algo muito preconceituoso e pessoal, por isso ela não pode servir de exemplo para a verdade absoluta".Mas, agora, me responda uma coisa na sua opinião: Quem é o herói? O bambambam que tira a camiseta na frente de milhões de brasileiros ou aquele garoto que sacrificou sua própria vida para poupar a vida daqueles que ele amava?É, acho que o conceito de "herói" passou por mudanças drásticas de um tempo pra cá.
Recentemente, outros dois casos parecidos com o de Lucas Vezarro estamparam as contra-capas dos jornais.Claro, as manchetes estavam voltadas ao suposto assassino de uma personagem em uma novela na TV Globo.
No primeiro caso, o surfista Tony Viela, 32 anos, pulou no mar para resgatar quatro outros surfistas que estavam com problemas graças ao mau tempo.Ele conseguiu salvá-los, mas isso lhe custou a vida.
Já no segundo , uma barbariedade: Fábio Carvalho da Silva, 24 anos, universitário, passava com seu Celta preto na margnial Pinheiros, zona Oeste de São Paulo, por volta das 23h desta quarta-feira, com sua namorada e mais uma amiga, quando parou seu carro para ajudar o motorista de um Ford Ka. Fábio então foi atingido por um caminhão cujo motorista não conseguiu fazer o desvio.Fábio morreu na hora.O caminhoneiro ficou inconsicente e foi levado ao hospital.A namorada e a amiga ficaram em estado de choque.E o motorista do Ka deu a partida e fugiu.
Embora no segundo caso seja ressaltada a atitude infantil do motorista do Ka, nos três casos percebemos que a solidariedade estava presente em cada um dos heróis.Eram três jovens e não mereciam o fim que tiveram.Mas isto levanta uma questão ainda mais...primordial: até onde vale a pena exerecer a solidariedade e a suposta cidadania? Eu daria a vida por alguém?Você daria a vida por alguém?É claro que tudo é uma questão de ética, mas eu acho que a solidariedade deve ser exercida sempre que há a possibilidade.Nem que seja em coisas relativamente pequenas, como, por exemplo, ceder um lugar para alguém no ônibus ou doando roupas para quem tem necessidade.São pequenas atitudes que tornam o mundo um lugar melhor, que nos fazem sentirmo-nos bem.
Quem sabe se começarmos a praticar com mais freqüência, o termo herói deixe de ter sua consistência em idiotas musculosos que aparecem na TV.